segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Quando a realidade é melhor do que a ficção - Além do Cabelo

Eu nunca fui de acompanhar novela, só ficava sabendo o que acontecia no desenrolar das histórias via rede sociais. 
A atual novela das oito, Amor à vida, tem ganhado muita repercussão, principalmente por causa da personagem Nicole, que é interpretada pela atriz Marina Ruy Barbosa. Na novela, ela teve Linfoma de Hodgkin, um tipo de câncer. Por conta desse papel, criou-se toda uma polêmica sobre o cabelo (lindo) dela, de que ela iria cortar, que já havia cortado... Mas por fim, a atriz não cortou, o que não condiz com o contrato, se pararmos pra analisar. Pareceu também que cortar o cabelo era um tipo de fracasso, o que esta longe da realidade de muita gente que passar por esse tipo de doença. Muitas pessoas fariam isso sorrindo, estariam lutando, com toda certeza!
Dando uma olhada no facebook, eu vi um pessoal compartilhando uma postagem de um blog que se chama Além do Cabelo. O post tem autoria de uma garota que tem mesma doença da personagem e na opinião dela essa história não serviu de inspiração para ninguém e que mesmo se a Nicole morresse, que morresse lutando, servindo de inspiração, deixando as pessoas ao redor dela mais felizes, como fizeram o Dr. David Servan-Schreiber, aHebeSteve Jobs, e recentemente a querida Talia Castellano, entre tantas outras pessoas que tiveram amor à vida.

Leiam a seguir o relato dessa garota...

Ontem, me prestei a ver a novela Amor à vida. Me prestei – porque eu já sabia que não ia gostar do que ia ver, mas mesmo assim resolvi ver. Pra quem não acompanha a novela, ontem foi ao ar a cena em que Nicole (Marina Ruy Barbosa) morre no altar, depois de saber que seu noivo estava de maracutaia com a sua melhor amiga. Mas ela morreu de que? De câncer? Não, ela morreu de desgosto, no melhor estilo me-segura-que-eu-vou-desmaiar. Mas essa não foi a pior cena – a chegada dela ao “Céu” foi tão medonha que só quem assistiu entende, eu tive vergonha alheia pelos envolvidos! Na verdade, a história toda da Nicole foi M E D O N H A.
Em primeiro lugar, a polêmica do raspa-não-raspa a cabeça. Eu entendo todos os motivos da atriz para não raspar a cabeça – eu mesma acho que não cortaria aquele cabelão lindo se fosse ela – mas, a partir do momento que se assina um contrato para viver uma personagem que tem câncer e que vai fazer quimio, é sabido que vai rolar de perder o cabelo! Se não queria/não podia raspar o cabelo, não devia nem ter aceitado o papel, tenho certeza que muitas atrizes raspariam a cabeça rindo. Mas ok, aceitou o papel e não quis raspar a cabeça.
Dizem que, na história original, Nicole (de cabeça raspada) iria se curar e o noivo falcatrua iria se apaixonar de verdade por ela e largar a pilantragem, e eles viveriam felizes para sempre. Com a recusa da atriz ao novo corte, o autor decidiu mudar a trama – escreveu no twitter inclusive que a história seria “muito romântica, uma das mais lindas que já escrevi”. Desde quando morrer no altar, com câncer, virgem e de olho aberto é uma história romântica?? Em que mundo essa gente vive?!
Defina "história romântica"
Defina “história romântica”

O que eu fiquei pensando foi: essa história foi boa pra quem? Informou as pessoas sobre o câncer? Não, as informações surgiram todas distorcidas. Nicole teve Linfoma de Hodgkin – a mesma doença que eu tenho – um dos cânceres mais curáveis que existe. E, ao contrário do boletim ~médico ~ da personagem, não existe metástase pulmonar nesse tipo de câncer! É tão errado quanto dizer que a garota tinha câncer de próstata! “Ai, tá, mas é só ficção…” Sabe quantas pessoas se informam através da novela? Sabe quantas pessoas que recém foram, ou vão ser diagnosticadas em breve vão entrar em pânico pensando que esse foi o câncer que matou a personagem? Pior ainda, além de passar informações errôneas sobre a doença, a emissora perdeu a chance de passar uma mensagem positiva!
Chega desse clichê tenho-câncer-não-consigo-mais-sorrir. Muitas pessoas, nesse exato momento, estão encarando um tratamento pesado contra o câncer e sorrindo, trabalhando, dormindo, pagando contas, vendo tv, transando, comendo, xingando o grêmio, sabe? A vida não pára só porque se está doente. Ninguém que tenha amor à vida e um diagnóstico de poucos meses restantes vai ficar chorando tanto quanto essa personagem! Se a Nicole fosse minha amiga eu dava de relho pra parar com o mimimi!
keep-calm-and-stop-mimimi-3
Além disso, essa polêmica de raspar ou não a cabeça não faz nenhum sentido. Exceto por algumas poucas quimios que não causam a queda, perder os cabelos não é uma escolha para quem tem câncer. É um momento triste? Sim, é! Para uns mais, para outros menos, mas todos sentimos a diferença na nossa auto imagem. Essa história de a personagem não cortar o cabelo porque queria estar bonita no altar é tenebrosa – ela estaria com o cabelo todo falhado no dia do casamento!  Se tivessem colocado uma touca pra fingir que a atriz estava careca, pelo menos seria mais verossímil. Aí a mensagem que isso tudo passou foi: que ficar careca é feio, que o cabelo define a pessoa, de que quem tem câncer passa o dia choramingo e que o câncer mata.
Pergunto de novo: essa história serviu de inspiração pra quem?! A personagem até poderia morrer, mas que morresse lutando, servindo de inspiração, deixando as pessoas ao redor dela mais felizes, como fizeram o Dr. David Servan-Schreiber, a HebeSteve Jobs, e recentemente a querida Talia Castellano, entre tantas outras pessoas que tiveram amor à vida.
As vezes  devemos parar  tudo o que estamos fazendo e olharmos para dentro de nós mesmos. Não é o superficial que te torna a melhor pessoa, mas sim os seus valores, o seu caráter, a sua dignidade, seus sonhos e acima de tudo o seu amor à vida. São maneiras de pensar como dessa garota que mudam um pouco nossa perspectiva sobre o mundo e quem o constitui. Perdemos tempo reclamando, nos preocupando com a "casca" e quem iremos impressionar e por aí a vida vai correndo, e quando percebemos que nosso aproveitamento de grandes causas e oportunidades, como aprender, foram zero, a única coisa que ficará é o arrependimento e frustração. Sejamos corajosos e audaciosos. Que nós possamos, a cada dia que passa, deixar o nosso barco coração a deriva da alma, do auto conhecimento e da reflexão. Falta isso para muitos telespectadores comovidos do plim plim. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário